terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Limites do Guardião


Há momentos na Vida em que embora tenhamos inspiração, os desafios que nos oferecem são superiores à vontade dos textos que se criam mentalmente em resposta às necessidades que nos rodeiam...às palavras que nos bailam no pensar, para com elas chegar aos outros, como se fosse uma mão de apoio...um braço que se estende...

Comecei este blog, com a vontade de convosco ir partilhando pensares, desabafos do que faz parte da Vida...com vontade de manter a esperança que baila em mim, quando olho a Vida...com vontade de que de alguma maneira as minhas palavras pudessem sair do meu consultório...fazer chegar uma pequena gota de afecto...mas, os últimos tempos foram agrestes...puseram a minha capacidade de gerir a Vida e os sentires à prova...fizeram-me gerir a vida como se se tratasse de apenas tentar flutuar...tentar manter-me à tona...e com isso aprendi que se pode viver algum tempo, em piloto automático, gerindo os pequenos fogos que nos rodeiam sem grande espaço para o extra, fosse esse extra positivo ou não...

Gostava de dizer que estou de regresso, porque escrever é uma paixão minha...mas, não sei...vou tentar definitivamente, porque não gosto de desistir de sonhos...mas não falarei de tempos...

O meu texto de hoje talvez seja um pouco sobre limites...os nossos, os dos outros, até os da dor...limites que se põem à prova no dia-a-dia...no viver, no respirar, porque há dias, ou momentos ou, Vidas, durante os quais...até custa a respirar...

Conheço uma pessoa (muitas, eu mesma, tantas outras em mim e por ai...mas aqui vou falar como se fosse apenas uma, como se fosse uma história) que às vezes, muitas vezes, se sente no seu limiar de existência; aqueles dias em que a pessoa se sabe forte, se conhece bem, sabe as suas capacidades, mas o botão de pânico activou-se, e de repente parece que tudo resvala, o prato encheu-se de tal maneira que mesmo com extremo cuidado, estão sempre coisas a cair, por muito que se equilibre, do prato resvala tudo...já não é só o que está a mais, até porque já nem se sabe ver o que é o "a mais", é tudo...

E nesses dias, a pessoa capaz, sente-se desconhecedora das suas fraquezas, confronta-se com as suas limitações, inibe-se de ser feliz, desespera, escurece, envelhece, mentalmente namora desistências, respira mal, dorme mal, come mal, ri pouco, e desperta uma anestesia, uma letargia, que lhe mostra "Olé!" atingi o cume de mim mesma, e daqui, não vejo nada, subi tão alto, que olhe para onde olhe, não há objecto no horizonte, ou, desci tão baixo, que nada me ilumina o caminho de regresso.

Nesses dias, testamos em nós mesmos o guardião de nós, da nossa essência, da nossa alma, do nosso EU...nesses dias temos de activar a defesa máxima, regressar a um zero e retomar o caminho, prestando auxílio a nós mesmos, fazendo exercício das funções básicas, até termos capacidade de fazermos voos mais altos. 


Nesses dias, temos de reaprender a forma de amor primária, de defesa do próprio, de preservação, de sobrevivência. É dia de nos darmos colo, e cuidarmos de nós, pelas raízes, até termos noção de que recuperámos (falo aqui de uma forma global, claro que em muitas pessoas, se estes dias se repetirem, e sintomas mais graves se desenvolverem, a pessoa pode estar a viver uma depressão e deve procurar ajuda médica, profissional, pois por si só não a irá curar, uma depressão não é sinal de fraqueza, é uma doença), até termos a noção que respiramos, olhamos a vida, que a sentimos na pele de novo, com coisas boas e más, mas, com sentimento, sem anestesia...sem viver apenas, e em exclusivo, para flutuar, para sobreviver...acordamos a querer viver, seja de que forma for...e ela, a Vida, que se revele.

Mas, como, chegamos a esse dia? 

Com o caminho de defesa que desenhamos e a acreditar que se quer mais...com um pouco de pensar mágico...de esperança...

Que amor primário é esse?

É o amor que nos defende, e que activa em primeiro lugar, as medidas de cuidar mais primárias: 

  • O dormir bem
  • O comer bem
  • O fazer algo que nos ocupe a mente - algo físico que nos faça descarregar o pensar "ruminante", que nos permita desligar de...ganhar distância
  • O retomar coisas (por pequenas que sejam) que nos costumavam dar prazer
  • O reencontrar de momentos de paz e silêncio (dentro da fé de cada um, desde o ir a uma igreja ou o ir até à beira-mar, o encontro do nosso santuário) 
  • O saborear do momento (mindfulness - fazer o que se está a fazer, com o total intuito de nos focarmos nesse dito momento, sem permitir à nossa mente o vaguear pelos problemas todos que nos assolam, fora desse mesmo momento que está a decorrer)
  • O parar de ter pensamentos negativos ou de impotência sobre o próprio...ter fé...
  • O viver do amor que existe, para com o próprio e os outros...mas primeiro, para connosco

Estas medidas (aqui apenas identificadas, não as desenvolvo porque aqui quero apenas deixá-las como ideias que terão de ser desenvolvidas e às vezes coadjuvadas), focam-nos o olhar, de novo, naquilo que nos compõe, e protege...e permitem salvaguardar em primeiro lugar o físico, para que exista saúde física, para que nesse mesmo processo se comece a cuidar da mente, buscando as energias iniciais, as que antecederam a queda ou a subida ao ponto do meu limite. 


Se eu conseguir, começar aos poucos a desligar o pensar repetitivo, a preocupação excessiva, permito-me o refocar da visão, em primeiro lugar nas funções de sobrevivência, e em segundo, no retomar de permeio as actividades de prazer, que me permitem, sentir pessoa de novo, inteira, vivente e capaz de enfrentar as "travessas" de forma a só ir pondo no prato o que o meu guardião me permitir...

Lidarei com tudo, mas, uma coisa de cada vez...apago os fogos todos, mas identificarei primeiro os mais graves...e não me permitirei queimar a mim mesma na fogueira que eu alimento. Cesso-lhe o oxigénio e faço-a morrer pelas suas próprias mãos, de forma a conseguir viver dentro das minhas próprias muralhas, para depois ir em frente e conseguir (de novo, e de novo...e de novo) ir viver a vida que tenho, na sua plenitude...na sua míriade de ofertas e desafios. 

Nas suas infinitas ofertas de viver eventos milagrosos, de beleza intensa, que vão aparecendo, revelando-se no tempo, desde um sorriso de felicidade dos nossos, ao arco-íris a seguir a uma chuva intensa, que vão desde o saborear uma água gelada num dia de calor, ao sentir o sol quente no rosto num dia de frio...ao ler um poema que nos toca, sentir que uma música nos retrata, ir a um concerto único, comer a comida favorita, receber um elogio por mérito, um "amo-te" expontâneo, ouvir uma gargalhada que contagia...também teremos e temos, e tívemos, ofertas desafiantes, penalizadoras, desgastantes, mas...é atribuir-lhes um peso, uma medida, que nos permita lidar com uma de cada vez.

Permitir que todas as outras pesem de forma positiva e renovem forças, é o caminho e, em último caso, se sentirmos que nos aproximamos de limites perigosos, é activar o guardião...e não permitirmos a nada, nem a ninguém, que atravesse muralhas e ponha em risco a essência.

Bora lá...com a força de cada um...nos desafios da vida única que cada um de nós tem, mas crentes, que com a distância devida, tudo tem solução...que mais não seja, uma temporária...

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