sexta-feira, 14 de outubro de 2016

No meu corpo...a beleza é minha.

Olá a todas...este texto é para nós mulheres.....para todas ou só algumas...

Hoje em dia, no cimo dos meus 45 anos, proficiente em todas as minhas mazelas e áreas a necessitar de remodelação ou melhor, aceitação, debato-me em conversas com amigas, clientes, familiares, senhoras que oiço à passagem pelos antros mais femininos (sem nenhuma intenção de descriminação de género) com as conversas que mantemos e nutrimos entre nós mesmas e aquela voz irritante do grilo falante, pendurado no nosso ombro, que nos chateia constantemente sobre onde é que a barriga devia estar, em que nível de suspensão deveriam os seios se encontrar, as imperfeições da pele aqui ou ali, as rugas que surgem, os cabelos que se pintam, as roupas que se escolhem para ocultar n partes do corpo, as luzes que têm de se apagar, entre tantas outras paranóias que nos assolam nestes monólogos a uma só voz - por sinal insana de todo, mas que nós veneramos e à qual parecemos obedecer na procura do santo Graal da beleza física, da perfeição definida sabemos lá nós por quem, mas que se escarrapacha em todos os sítios que visualmente nos invadem as retinas e nos forçam a evoluir o conceito de beleza, para algo que eu de forma simpática defino como doente.

Bolas...

Quando eu pergunto a alguém, o que ama no outro, o que aprecia no outro. Surgem tantas características, tantas, e das quais nem metade são físicas, ou sendo, passam por elementos não passíveis de críticas. Se eu pergunto porque sente ou acha que o "outro", o alvo dos afectos é belo...ou pergunto se o acha belo, a maior parte das vezes a resposta é positiva, senão sempre, e ao descrever o outro, a descrição revela realmente uma pessoa adorável, que eu aos olhos da descrição também quero conhecer, mas que raramente me fornece os dados biométricos do indivíduo em questão.

Então, porque nos andamos a tornar obcecados com a física?



É por questões de saúde? 

Não pode, porque muitas das pessoas que são hoje admiradas pela sua beleza, vivem vidas doentes para estar dentro desses conceitos. Não pode, porque os seus pesos e medidas, são quase impossíveis de atingir pelo grosso da população pelas suas próprias estruturas físicas. Não pode porque a pessoa não vive para estar e ser saudável, vive para caber dentro de um determinado número ou atingir um determinado peso. Come de forma matemática, conta as calorias, os componentes de cada grupo alimentar, pesa os alimentos, conta copos de água, conta as horas sem comer, mede-se, pesa-se...aprisiona-se a objectivos, que dão ilusões de controlo.

Para mim, em desabafo, em abanão a nós mulheres, digo que é porque nos amamos pouco. Porque não nos sabemos belas, não nos sentimos bonitas, não somos donas do mundo, perdemos-nos de nós e vemos sombras nas coxas, peles enrugadas, duplos queixos, mazelas invisíveis a olho-nu, mas que para nós estão mapificadas, como as curvas geodésicas das montanhas mais estudadas.

É claro que é importante gostar do nosso corpo, estar em paz com ele, tentar ser e estar saudável. Lutar para que o desleixo, a desistência, a dificuldade, a doença (em alguns casos) entre tantas outras razões, não nos levem a um estar que não aceitamos, que nos massacra, tornando-nos infelizes. Mas, cuidado com os exageros, porque temos de aprender a amar tudo de nós, reconhecer a beleza que a mulher tem em si, só por ser. As intrincadas redes que nos compõem e definem, caracterizando as nossas personalidades, no conjunto do corpo que é sedutor, com curvas, detentor de capacidades únicas, desenhado e moldado para cativar, onde se depositam as capacidades de amar de forma única, de sonhar e editar a vida. Onde um olhar revelador, seduz e controla. Onde apenas uma vontade intelectual, pode ser a ferramenta mais bela de um relacionamento.

No outro dia, disseram-me que eu era vaidosa.

 
Fiquei a pensar...e tenho duas respostas.


Não, não sou. Aprendi foi a amar-me como sou e gosto muito de mim. Acho-me bonita, na maior parte dos dias e nos que não estou ou sou, ou sinto que não estou ou sou, não deixo de gostar de mim.


E sim, sou vaidosa

Sou porque sei o que tenho em mim que gosto, que realço, em que me apoio para a imagem que reside de mim em mim. Sou na escolha do que visto, no toque que quero dar, na forma como me quero pôr a enfrentar o mundo que me espera. Sou porque gosto de me ver, porque toda eu conto uma história, até nos dias em que não me sinta assim. Sou, porque não me admito a mim mesma elevar auto-críticas ao papel de me ditarem, como me vejo ou quanto de mim gosto. 

Mas, sou uma vaidosa em mudança, porque tenho de aprender a ir reconhecendo aquela que sou, na passagem do tempo, no que perco ou ganho com a chegada de mais um dia ou um ano. Acima de tudo sou vaidosa, porque venço as lutas com a minha própria imagem, não permitindo que o mundo lá de fora, das capas de revista, das imagens vendidas, me ditem quem sou. A beleza é minha. A beleza é nossa. E se dentro de nós residir uma mulher que se ama, há uma beleza infinita que se estende aos outros.

quarta-feira, 20 de julho de 2016

E há pessoas assim...

Nas relações humanas, tenho visto de tudo, tenho ouvido de tudo e vou-me confrontando com aprendizagens sobre os seres humanos a toda a hora.

Por mim, o mundo não era assim, com pessoas assim...era um mundo com pessoas inteiras, donas de si, que na sua existência e essência soubessem respeitar o outro na sua inteirice e não cá por metades ou apenas partes.

Isto das pessoas assim, não aceitarem que cada um é em si mesmo uma peça única, com todas as estranhezas ou riquezas que a definem, rouba a vida do seu bem maior e passa a entregar-nos o outro numa interpretação constante de quem eu acho que o outro é, com expectativas a serem goradas e desilusões a baterem à porta.

Desde quando é que no conhecer do outro, devemos nós partir do pressuposto de que o outro se mede por medidas semelhantes às minhas?

Que real interesse isso teria...?

Talvez tivesse contida em si a resposta de quem é que eu sou, isso sim. A resposta que eu busco no reflexo de mim nos outros ou do que idealizo ver de mim nos outros. Talvez seja a reflexão de que me procuro eu no outro e vou assim tentando obter respostas no "desenhar" das pessoas com quem me vou cruzando.

A verdade é que até podemos ter afinidades, sem dúvida. Até podemos ter valores morais semelhantes, padrões de cultura ou de comportamento idênticos mas, na realidade, na vida vivida no seu dia-a-dia, somos diferentes até à última célula (e talvez quase iguais em todas elas) e diferenciados desde o pensar, ao sentir, ao agir.

E, se conseguíssemos  ver as pessoas assim talvez se tornasse uma tarefa mais fácil aprender a aceitar o outro por quem é, no que dá, no que não dá, no que o define, no que o inquieta, no que o apaixona ou torna curioso. Talvez conseguíssemos andar todos mais felizes, com menos desilusões, com mais amor verdadeiro dentro do peito, porque entendemos que o outro é assim e tem o seu espaço próprio, que não é definido por mim e pelos meus desejos ou vontades.

Talvez vivêssemos a magia de conhecer realmente o Outro, entidade completa e distinta de mim e das minhas projecções.

Há pessoas assim, que desiludimos ao sermos, porque apenas não somos quem eles julgavam que fossemos. Há pessoas assim, desejosas de nos aceitar, não sabendo como, querendo descobrir porque fascina, mas desertas também de realizar o sonho de nos transformar na pessoa que acham que somos, porque é dessa que talvez gostem mais. Ou, é essa que julgam gostar mais...

E se as pessoas fossem todas assim, a achar que as outras são...à medida dos seus sonhos e fantasias, então não havia pessoas, nem assim, nem de maneira nenhuma, porque as que havia nunca eram...

Ser amigo é uma trabalheira, ser companheiro mais ainda, porque o gostar e o amar tudo intensifica. Ser pai ou mãe, filho ou filha é um labirinto. Ter papéis e representações de nós mesmos uma tese de mil páginas...Ser Pessoa é complexo, lição inacabada. E ser eu, já é trabalho que chegue, ou não? Vamos lá ser quem somos e reconhecer os outros por quem são. Porque há pessoas sim, todas elas como são.

sexta-feira, 17 de junho de 2016

Presos na dor...

Baixo os braços...perco a luta, saturo-me do combate, tenho momentos que me dói de doer, que não quero mais, me perco na escuridão de uma pele mortiça que redoma a destruição maciça.

A dor crónica tira o respirar, tira a paciência, tira o sorriso da alma, enruga o corpo, desfeia o rosto, escurece o céu, enegrece os pensamentos, torna macilenta a Vida. Rouba a criança, arrasa o adulto, massacra a família.

Acordar sem dono, acordar querendo continuar a dormir, porque se julga aliviar.
Foge-se dela, como se fosse possível, mas ela arrasta-nos ao chão, luta connosco e prova-nos a vitória, que nos escorrega das mãos.

Tem dias, dias longos e penosos, que nos fogem da memória mas, que marcam em feitio e a certa altura em personalidade. Tem dias curtos, que nos iludem e namoram, como se de repente afinal fosse possível ser sem dor. E nesses rasgos de luz, nessa ilusão, cria-se uma esperança e buscam-se forças para que o amanhã venha mais cheio, mais doce, menos cruel.

Viver na dor, é viver preso. É ter de querer aprender a viver com, e não apenas pensar que se quer sobreviver.

Enquanto se tenta apenas sobreviver, deixar passar o tempo, numa anestesia mental de que talvez um dia ela desapareça e nunca mais volte, é não viver, porque se assenta o amanhã, os momentos seguintes no seu desaparecimento total. Porque se sonha que só se vai viver de novo, quando ela não estiver. Mas, isso é que é o pesadelo, que nos arrasta para uma vivência em modo de sobrevivência, numa esperança ridícula que não nos permite nada, porque a dor fala mais alto.

A dor, se for crónica, é para ficar. Temos de a conhecer, profundamente e reconhecer o nosso eu, que se perde nas suas teias. Destrinçar quem sou, da dor. E diferenciar, quem quero continuar a ser no meio dela.

Com isso em mente aprender a saber quando consigo eu enganá-la. Quando e porque é que às vezes a consigo apanhar distraída. Que momentos do dia, da semana, do mês, tenho eu menos presença da inimiga? Há ciclos ou não? Que poder tenho eu sobre? Que recomendações é que já tentei e resultaram?
Que quero eu?

E ganhar terreno sobre é crucial. Não permitindo que a dor me anule, me altere, me transforme tanto que eu não me reconheça.
Tenho dias de gruta, de animal enjaulado, em que teria fome de sangue, contra um inimigo invisível, em que me dói estar vivo. E? Que faço eu? Atiro a toalha ao chão? Deixo que a minha essência me seja roubada, violentada, atirada às ondas na impotência de não saber com o que contar? Ou, à minha maneira, no meu saber de mim, que mais ninguém tem, luto contra?

Temos muitas das vezes de educar quem rodeia, explicar em que mundo nos vemos de vez em quando e porque é que em certos momentos, um monstro toma posse de nós. Temos de ser porta-voz da nossa dor, descrever, pedir empatia para com os nossos viveres. Mas, acima de tudo, temos de nos ajudar a não cair nos círculos que a dor nos cria, que nos empurra para, onde nos perdemos em dores maiores, que deixam de ser físicas ou psicológicas, para serem dores gerais.

Tenho dias que me dói a pele, como se não suportasse o meu próprio peso. Tenho dias que me dói a alma. Tenho dias que não sou eu, que me desconheço no espelho ou nos limites físicos de mim, que me definem como fronteiras para com o mundo. E nesses dias era tão fácil sentir-me só, sentir que sou única no mundo e que sou a pessoa que ninguém compreende. Nesses dias era tão fácil, sendo cruel, ouvir as sereias que me tentam como aos marinheiros, a agir na loucura de um momento, um momento de desespero e de impotência. 

Mas...esses dias têm de ser banidos, lutados contra, erradicados, recusados. Esses dias, eu levo ao tapete e ando à pancada, mostrando que no meio de tudo ainda existo eu, a que me guarda, a que zela, a que se recusa a deixar de sonhar ou de viver com a vontade, a gana que me define.

É uma luta, é.
É desesperante, sim.
Mas, a sobrevivência não reside no viver, reside nesta luta que eu não posso permitir que a dor ganhe, para que a vida seja então vivida e não sobrevivida.

É nessa luta que me foco, não contra mim, o mundo, a fé, Deus, a medicina, os outros...é na luta contra a dor que despendo as minhas forças. Na sua banalização, no roubar-lhe o poder de me dominar. Focando a minha mente (com tudo o que me reste), em seguir caminho, uns dias sem me sequer lembrar que ela existe, noutros a lembrar-me a todo o momento que não quero que ela exista.

Há dias em que a mando à merda, com toda a força, outros...os mais difíceis, tento fugir não dela, mas da pessoa em quem ela me quer transformar.

Nos dias que me dói a pele e a alma, peço colo ao mundo e faço dentro da minha mente reuniões com os administradores, vendo os melhores cenários, não me deixando ir à falência. Se for preciso choro, e choro muito, mas depois não lhe dou vitória. Não posso, não devo e acima de tudo não quero. Não quero ser presa da dor. E muito menos que ela me defina.

Vamos à luta e quando faltarem forças, vamos aprender a pedir ajuda. Vamos aprender a pedir colo.

Vamos acreditar, que há dias melhores e saborear na memória tudo o que já fomos e somos. Há dias em que independentemente das condições adversas, renascemos e não deixamos de ser nós, em grande, em pleno.

Bem hajam os que lutam contra a dor. E vamos lá com força nas "canetas", que a vida é para ser gozada à grande.

sexta-feira, 20 de maio de 2016

Sonhos...

Hoje acordei com este mote na cabeça, e decidi escrever algo sobre os sonhos.
Não aqueles que nos reinventam de noite, que nos arrumam os pensares e servem os seus propósitos fisiológicos, mas aqueles que nos mantêm acordados, nos impulsionam, nos fazem ser, nos encaminham pela Vida.

O que são os sonhos, porque é que o Homem sonha? Porque precisamos nós de sonhar? É o homem insatisfeito e os sonhos são a resposta a essa insatisfação? Ou, os sonhos guiam o desejo de querer mais da Vida, de nós, dos outros...

Será que acreditamos ser gigantes em nós mesmos, e nos sonhos damos asas a esse voo, conseguindo ser maior, ser mais feliz, ser mais...ser eu?

A cada sonho realizado que sentimos nós? A cada sonho perdido, que perdemos nós?

O Homem vive num mundo encantado, rodeado de teias minusculas e intrincadas de oportunidades de sonhar, mais e melhor. Vive carregando dentro de si milhares de sonhos, desejos, vontades, que brilham no interior, como se de estrelas se tratassem, para guiar o caminho a um mundo melhor.

O Homem alimenta-se de sonhos, como da Vida, porque é nestes desejos do que fazer, do que ser, do que ter, de onde ir, que o Homem na realidade existe e encontra a energia para querer ser mais...ou mesmo, até, a energia para ser.

A essência de nós está nos sonhos, nos desejos e vontades, que traduzimos e contamos vezes sem fim, no nosso eu interior, onde bailam cenas da realidade, e de um futuro sonhado.

Olho o meu rosto no espelho, e sonho um dia mais tarde, envelhecer com graciosidade, com o rosto a espelhar a menina que trago ao colo dentro de mim.

Olho uma praia bela, imensa, pura...num dia perfeito, com um pôr-do-sol fascinante e sonho lá voltar, repetir a experiência. Olho o rosto do meu filho, e imagino-o crescido, dono da Vida, parte de mim...num rosto crescido fruto do caminho, rosto que revejo em viagens mil e, sonho estar lá no caminho, fazendo parte da história, criando avenidas por onde ele passe e sonhando em conseguir limpar-lhe o caminho.

Olho a casa, as paredes...e sonho com a cor da parede, penso no sofá que se precisa...na moldura por pendurar. Viajo de carro, e penso naquele que sonhava ter em miúda, quando tirei a carta...e penso, se tenho o sonho de um dia o ter, ou se o sonho mudou...

Olho o rosto, que dorme ao meu lado e sonho aliviar a expressão, sonho os ontens todos e crio ciúme do que já não vivo, mas sonho com os amanhãs que restam. E sonho tanto. Penso quem sou, o que faço...o que reconheço em mim ou, que gostava de mudar e começo novos sonhos, onde tento encontrar os momentos onde o vou tentar fazer...e sonho mais.

Sonho em ser melhor e mais de mim, dar tudo para saber que acredito, que serei capaz de caminhar sem medo de errar, porque sonho em corrigir em lucidez as coordenadas. Acentando âncoras onde tiver porto, montando acampamento onde temos de permanecer até saber seguir.

Acordo, nos braços de um sonho, e sonho tantos outros, sobre todos os caminhos que quero trilhar. Questiono se a vida me basta, se serei pessoa que chegue, se terei forças que restem, ou oportunidades por vir, que me permitam, nesses acordares, nesses desejares, a concretização dos sonhos todos.

E às vezes sonha-se tarde...num tempo curto, em que ainda queremos dar sonhos aos outros, finalmente prontos para...mas, o tempo talvez já não toque a seu jeito.

E às vezes acorda-se na vida, e sabe-se que em partes de nós adoecemos, temos lutas a travar, contra doenças, contra invasores, faltas de cuidados, irresponsabilidades jovens, marcas de desleixo...e percebemos que precisamos de mais, mais tempo para sarar, mais tempo para sonhar e agradecer o que se tem e sonhou. O que não se perdeu, o que remanesce. O que cria caminho de frente, de rosto de fé...

Sei que o melhor da Vida, está por chegar...sonho que sim.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Somos sós...numa sociedade só?

 
Tem companhia?
Tem quem o oiça?
Sente-se ouvido?
Quando precisa de alguém, tem?
Tem amigos?
É amigo?
Gosta de estar só?

Que caminho vamos nós caminhando enquanto sociedade, na companhia ao próprio, ou ao outro? Que tempos temos para dar a nós mesmos, para que tenhamos essa presença, a presença junto da família alargada, dos amigos próximos, de si mesmo...

A nossa sociedade constrói-se cada vez mais de um espaço onde se existe, supostamente numa vida montada em facilidades novas e modernas. Temos máquinas para quase tudo, temos carros que nos levam de um sítio para outro numa velocidade incrível, temos sítios onde conseguimos tratar de muitas coisas ao mesmo tempo, temos a vida organizada em blocos de tempo de forma a podermos trabalhar, cuidar do corpo, comer, dormir, ser feliz...

Será? Será que é assim mesmo, que no meu dia da vida gerida dessa forma, compactada ou super-organizada, conseguimos ser, existir, ir além do fazer e do ter?
Será que nessa organização para a busca do El Dourado da felicidade suprema, existimos de forma plena? Será que conseguimos SER?



Temos nós neste estar de sociedade actual...espaço para termos companhia? Vivemos mesmo em sociedade no sentido de grupo, ou vivemos em solidões disfarçadas de um mundo tecnológico de companhias virtuais. 

Estaremos a ser criados, desenvolvidos em "galinheiros" emocionais, onde o "Olá, estás bem?", passou a ser o bom dia de antigamente. Em que a resposta nem sempre vinha, ou nem sempre se queria saber, fazia-se apenas por uma questão de educação...será que queremos mesmo saber? Será que se o outro quiser dizer, que não, eu tenho espaço em mim para ouvir?

Eu não me sinto, na maior parte das vezes capaz, de viver uma vida socialmente activa, sinto que os meus tempos são raros, e que é com grande gestão, mestria que consigo de alguma forma, quase malabarística, gerir o "outro" na minha Vida...mas, recuso-me a ceder, e a deixar que este vazio colectivo, de alheamento às pessoas que os outros são tome posse de mim, do meu ser social, que eu sei florir na presença humana.

Nós somos seres que necessitamos do contacto, do afecto, do toque, do saber sentir e de sentir em nós a imensidão de afectos que pertencem ao grupo das emoções que só se obtém através de, e nas, relações.

Nós existimos sem o outro?

Eu acho que não. O outro é o espelho de mim, e às vezes a voz do bom senso que me retribui uma imagem de mim, mais doce, mais fiel, mais inteira. O outro comprova-me que eu estou cá, que há razões maiores, para além de mim, para estarmos todos por aqui, nesta caminhada célere, agreste...bela, profícua, intensa, vida em si mesma.

Sentir solidão, não é estar só, é estar vazio. (Sêneca)

Eu não estou vazia, nem quero estar. Não quero redomas, não quero aquários, ou laboratórios experienciais, quero tempo, quero saber gerir a Vida, para saber que não vou só, que não estou só, que não sou só.

Não quereremos todos? E vocês estão bem? 

sábado, 13 de fevereiro de 2016

Estou a envelhecer e eu sei...


O tempo passa, de uma forma própria, sem intervenção minha...somo os caminhos e as conquistas que enfrentei, sei quem sou, tenho um legado, tenho um património e não sinto que tenha parado...

Mas, nesse tempo que passa, às vezes faço o que critico...não me cuido, numa recusa de saber que estou velha, gasta, cansada...numa tentativa de não querer saber se sinto, o tempo, de forma diferente...

Na tentativa de ocultar de mim, os medos que tenho de me sentir diferente...estarei mais só, ou nesta minha viagem, neste ponto de mim, sou mais só...e não é tudo uma questão de estar?

Levo mais tempo a ser...demoro mais em mim mesma na execução daqueles "algos" todos que antes eu fazia melhor...

Vivo stress com pouca coisa, aprecio mais o silêncio, gosto mais de ordem e a fuga à normalidade assusta-me mais...estou menos elástica em mim...desde a pele até ao pensar. Quero que tudo se vá resolvendo porque o tudo me preocupa.  Às vezes só sossego quando sei que todos os entes (meus), estão no porto, no porto seguro. E que ilusão essa, qual porto seguro?

Às vezes não sei sossegar...porque não sossego em mim as inquietações que tenho pela vida dos outros e pela impotência, no tempo que sinto, de não conseguir ajudar, ou melhor, melhor...resolver.

Acordo de forma diferente e todos os dias me adapto à perda, ao que já fui. Parece que se paro, me forço a ver a Vida como se fosse o meu álbum de fotografias, que tenho no móvel da sala, sinto os lapsos de tempo, tenho uma nostalgia linda, sinto-a no peito, no sorriso dos netos, na carícia do filho, no olhar de amor, de ti...companheiro...sinto-a porque tenho tudo o que consegui, mas sinto o tempo, em mim, numa corrida. 

E tenho de te aceitar, comedor voraz...tenho de aprender que eu, este novo eu, que me acorda todos os dias, vê pior, perde amigos ao bater do relógio, que me esqueço, e que me esqueço que esqueço, que me questiono, me perco, me desregulo nos químicos que por mim passeiam, que me oiço, desde as dobradiças, aos pensamentos, como se dentro de mim, folheasse em simultâneo o tempo detrás e os dias que ainda não nasceram...

Hoje acordo virada ao fim, virada ao saber que os dias que escorrem, têm de ser saboreados, partilhados, sem mágoas, numa tentativa de deixar cair o perdão, como se fosse água em dias de chuva...

Quero paz...minha e universal, não me basta a minha, porque quem sabe o que o tempo é, sabe que tem de começar a organizar, a viver, a por de lado, a deixar cair, a seguir, a respirar fundo até sentir as costelas todas esticadas, no minuto que se perde a saborear a vida, como se fosse o sal que se lambe dos dedos, ao comer churrasco...sabe melhor quando se viveu muito tempo...

Tudo sabe melhor, porque também parece que se tem mais tempo, dentro do pouco que se sabe que se tem...é estranho, mas vivemos assim. Eu sei o que queria. É engraçado, quando tinha 18 anos, sabia muito sonhar, mas não sabia tudo o que queria. Agora, se me dessem a oportunidade, enchia um livro...

Aprende-se a saber o que se quer. Mas fugimos dessa sapiência quando toca ao sentir da perda. Tenho de ir aos médicos, como se eles fossem meus amigos, vejo-os mais a eles, do que a família. Tenho de adquirir uma série de "ajudantes para a vida", só para ver, às vezes, preciso de dois pares de óculos. Tenho caixinhas com medicamentos, tenho de me lembrar de pôr lembretes do que quero fazer, tenho agendas com datas médicas, para saber de ontem tenho de perguntar, mas lembro-me bem de há muitos anos. Engraçado, como disse...O tempo ganha outra dimensão.

Às vezes gosto de saber que me ouvem, tenho tanto testemunho a passar, tanta história a revelar, tanta emoção que quero reviver, sentir hoje, como se pudesse com isso saborear de novo esses caminhos, que hoje já não calcorreio.

Falava de legado. Era isso que eu queria deixar. Nas conversas que tenho, nas minhas memórias que dou. Quero muito isso, neste envelhecer, dar de mim, fazer o outro saber, para que este caçador voraz, não me leve isso, e quem fica, saiba manter-me um dia, nesses lapsos de tempo que dei, que eram meus e agora podem ser de novo do mundo.

Estou velha, mais velha. E neste passar do tempo, queria tanto ainda tocar o mundo, com a pontinha dos dedos. Deixar as minhas estrelas, no céu escuro. Deixar, na boca dos netos, as histórias que contei, na fatia do bolo quente, na torrada com mel, no sorriso da minha boca, no fim de um ralhete. Queria tanto não me sentir só comigo, não sentir que não tenho quem me escute.

E porque sei tudo isto, contei...e no contar pedi, e agora aguardo que me tenham ouvido e me consigam ir dando, isto tudo que disse e que tenho medo de me esquecer, que no fundo só quero, saber que me amam, no ouvido emprestado, no mimo que não fica guardado.

Estou a envelhecer, eu sei...toma conta de mim.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Limites do Guardião


Há momentos na Vida em que embora tenhamos inspiração, os desafios que nos oferecem são superiores à vontade dos textos que se criam mentalmente em resposta às necessidades que nos rodeiam...às palavras que nos bailam no pensar, para com elas chegar aos outros, como se fosse uma mão de apoio...um braço que se estende...

Comecei este blog, com a vontade de convosco ir partilhando pensares, desabafos do que faz parte da Vida...com vontade de manter a esperança que baila em mim, quando olho a Vida...com vontade de que de alguma maneira as minhas palavras pudessem sair do meu consultório...fazer chegar uma pequena gota de afecto...mas, os últimos tempos foram agrestes...puseram a minha capacidade de gerir a Vida e os sentires à prova...fizeram-me gerir a vida como se se tratasse de apenas tentar flutuar...tentar manter-me à tona...e com isso aprendi que se pode viver algum tempo, em piloto automático, gerindo os pequenos fogos que nos rodeiam sem grande espaço para o extra, fosse esse extra positivo ou não...

Gostava de dizer que estou de regresso, porque escrever é uma paixão minha...mas, não sei...vou tentar definitivamente, porque não gosto de desistir de sonhos...mas não falarei de tempos...

O meu texto de hoje talvez seja um pouco sobre limites...os nossos, os dos outros, até os da dor...limites que se põem à prova no dia-a-dia...no viver, no respirar, porque há dias, ou momentos ou, Vidas, durante os quais...até custa a respirar...

Conheço uma pessoa (muitas, eu mesma, tantas outras em mim e por ai...mas aqui vou falar como se fosse apenas uma, como se fosse uma história) que às vezes, muitas vezes, se sente no seu limiar de existência; aqueles dias em que a pessoa se sabe forte, se conhece bem, sabe as suas capacidades, mas o botão de pânico activou-se, e de repente parece que tudo resvala, o prato encheu-se de tal maneira que mesmo com extremo cuidado, estão sempre coisas a cair, por muito que se equilibre, do prato resvala tudo...já não é só o que está a mais, até porque já nem se sabe ver o que é o "a mais", é tudo...

E nesses dias, a pessoa capaz, sente-se desconhecedora das suas fraquezas, confronta-se com as suas limitações, inibe-se de ser feliz, desespera, escurece, envelhece, mentalmente namora desistências, respira mal, dorme mal, come mal, ri pouco, e desperta uma anestesia, uma letargia, que lhe mostra "Olé!" atingi o cume de mim mesma, e daqui, não vejo nada, subi tão alto, que olhe para onde olhe, não há objecto no horizonte, ou, desci tão baixo, que nada me ilumina o caminho de regresso.

Nesses dias, testamos em nós mesmos o guardião de nós, da nossa essência, da nossa alma, do nosso EU...nesses dias temos de activar a defesa máxima, regressar a um zero e retomar o caminho, prestando auxílio a nós mesmos, fazendo exercício das funções básicas, até termos capacidade de fazermos voos mais altos. 


Nesses dias, temos de reaprender a forma de amor primária, de defesa do próprio, de preservação, de sobrevivência. É dia de nos darmos colo, e cuidarmos de nós, pelas raízes, até termos noção de que recuperámos (falo aqui de uma forma global, claro que em muitas pessoas, se estes dias se repetirem, e sintomas mais graves se desenvolverem, a pessoa pode estar a viver uma depressão e deve procurar ajuda médica, profissional, pois por si só não a irá curar, uma depressão não é sinal de fraqueza, é uma doença), até termos a noção que respiramos, olhamos a vida, que a sentimos na pele de novo, com coisas boas e más, mas, com sentimento, sem anestesia...sem viver apenas, e em exclusivo, para flutuar, para sobreviver...acordamos a querer viver, seja de que forma for...e ela, a Vida, que se revele.

Mas, como, chegamos a esse dia? 

Com o caminho de defesa que desenhamos e a acreditar que se quer mais...com um pouco de pensar mágico...de esperança...

Que amor primário é esse?

É o amor que nos defende, e que activa em primeiro lugar, as medidas de cuidar mais primárias: 

  • O dormir bem
  • O comer bem
  • O fazer algo que nos ocupe a mente - algo físico que nos faça descarregar o pensar "ruminante", que nos permita desligar de...ganhar distância
  • O retomar coisas (por pequenas que sejam) que nos costumavam dar prazer
  • O reencontrar de momentos de paz e silêncio (dentro da fé de cada um, desde o ir a uma igreja ou o ir até à beira-mar, o encontro do nosso santuário) 
  • O saborear do momento (mindfulness - fazer o que se está a fazer, com o total intuito de nos focarmos nesse dito momento, sem permitir à nossa mente o vaguear pelos problemas todos que nos assolam, fora desse mesmo momento que está a decorrer)
  • O parar de ter pensamentos negativos ou de impotência sobre o próprio...ter fé...
  • O viver do amor que existe, para com o próprio e os outros...mas primeiro, para connosco

Estas medidas (aqui apenas identificadas, não as desenvolvo porque aqui quero apenas deixá-las como ideias que terão de ser desenvolvidas e às vezes coadjuvadas), focam-nos o olhar, de novo, naquilo que nos compõe, e protege...e permitem salvaguardar em primeiro lugar o físico, para que exista saúde física, para que nesse mesmo processo se comece a cuidar da mente, buscando as energias iniciais, as que antecederam a queda ou a subida ao ponto do meu limite. 


Se eu conseguir, começar aos poucos a desligar o pensar repetitivo, a preocupação excessiva, permito-me o refocar da visão, em primeiro lugar nas funções de sobrevivência, e em segundo, no retomar de permeio as actividades de prazer, que me permitem, sentir pessoa de novo, inteira, vivente e capaz de enfrentar as "travessas" de forma a só ir pondo no prato o que o meu guardião me permitir...

Lidarei com tudo, mas, uma coisa de cada vez...apago os fogos todos, mas identificarei primeiro os mais graves...e não me permitirei queimar a mim mesma na fogueira que eu alimento. Cesso-lhe o oxigénio e faço-a morrer pelas suas próprias mãos, de forma a conseguir viver dentro das minhas próprias muralhas, para depois ir em frente e conseguir (de novo, e de novo...e de novo) ir viver a vida que tenho, na sua plenitude...na sua míriade de ofertas e desafios. 

Nas suas infinitas ofertas de viver eventos milagrosos, de beleza intensa, que vão aparecendo, revelando-se no tempo, desde um sorriso de felicidade dos nossos, ao arco-íris a seguir a uma chuva intensa, que vão desde o saborear uma água gelada num dia de calor, ao sentir o sol quente no rosto num dia de frio...ao ler um poema que nos toca, sentir que uma música nos retrata, ir a um concerto único, comer a comida favorita, receber um elogio por mérito, um "amo-te" expontâneo, ouvir uma gargalhada que contagia...também teremos e temos, e tívemos, ofertas desafiantes, penalizadoras, desgastantes, mas...é atribuir-lhes um peso, uma medida, que nos permita lidar com uma de cada vez.

Permitir que todas as outras pesem de forma positiva e renovem forças, é o caminho e, em último caso, se sentirmos que nos aproximamos de limites perigosos, é activar o guardião...e não permitirmos a nada, nem a ninguém, que atravesse muralhas e ponha em risco a essência.

Bora lá...com a força de cada um...nos desafios da vida única que cada um de nós tem, mas crentes, que com a distância devida, tudo tem solução...que mais não seja, uma temporária...