terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

É proibido morrer, não me envelheças nas mãos...


O envelhecer, a morte dos nossos, a perda de capacidades, a entrada numa estrada que nos assusta...

Este tema não nos é fácil, mas é um tema que me aparece tanta vez em conversas...como nos zangamos com a Vida e com os que nos envelhecem na mão, como nos culpabilizamos a toda a hora, de na volta do minuto, nos arrependermos do que acabámos de dizer...que revolta é esta que a nossa voz transporta, contra os que amamos, mas envelhecem ao nosso olhar...

"Chego, convicta de que vos vou abraçar com palavras, gestos de ternura e carinho, e que vos vou compreender, talvez até aceitar todas as vossas peculiaridades, sonho com o colo que tive, ou com o que quero, com o vosso gesto de total admiração por mim vossa filha, entidade que vem de vós...quero essa sensação, durmo com alguma culpa no colo, por estar longe, porque me vejo sempre confrontada em ser convosco a pessoa que não sou nestes meus sonhos em que vos vejo eternos, presentes, à mão de semear e prontos para me darem uma debandada se assim fosse necessário, mesmo sendo eu agora mulher adulta.

Mas, quando ai chego, quando estendo o rosto para o beijo habitual, ou para que de um abraço surja o meu grito alto de amo-vos...começo logo a ser quem sou, talvez criança assustada por vos ver a envelhecer, a partir de mim todos os dias um pouco...apareço refilona, a contrariar a vossa essência, a ditar regras, a manter-me firme nos meus pressupostos de adulta, talvez com muito tempo e cheia de medo dele e do que me sobra."

Ultimamente tenho-me confrontado com os desabafos de filhos, que ao verem os seus pais envelhecerem, adoecerem ou, porque sentem as perdas das suas capacidades, surgem numa angústia terrível. 

Consigo vestir o fato, porque também eu sou filha...sei que nos sentimos em desconforto porque se está longe, estando perto, ou porque não se pode estar perto, porque se quer dar e não se sabe bem o quê...porque se quer escolher por eles, porque se quer poupar a sua vida e prolongá-la até mais não...e por vezes nessa batalha própria e contra a vida que os leva, não os ouvimos, ou, esquecemos-nos num egoísmo muito próprio, que somos nós que às vezes porque os queremos tanto, que não conseguimos ver que eles se estão a acabar, ou a desgastar...e que não é agora que vamos batalhar diferenças, maneiras, estados de alma ou de acção...a partir de agora estamos cá para ser...para dar aquele abraço, ouvir o que têm a dizer e às vezes, pouco mais.

Oiço a história da filha que ao ter um pai de 80 anos diabético, luta para que ele não coma doces, para que faça exercício, para que cumpra ditaduras médicas (completamente justificáveis), mas que do ponto de vista humano, questiono eu, é com essa idade que a pessoa se vai privar? É ético exigir isso, porque como pagamos a saúde uns dos outros, não queremos as consequências de um comportamento não preventivo, ou, é nosso dever de filhos, substituir a capacidade de decisão própria e o seu livre arbítrio, porque a consequência dessa atitude, um, nos pode privar mais cedo da sua companhia, ou, dois, nos pode envolver nas consequências não ponderadas pela perpetuação de comportamentos de conforto (paliativos) para com os nossos familiares envelhecidos?

Somos nós que decidimos onde eles vão ficar? Ou, somos nós que temos de os deixar decidir? E como articular qualquer uma dessas decisões...?

Como viver, com estes novos "eles", que amamos e às vezes, no nosso passado comum, enfrentávamos e tentávamos que nos vissem como crescidos, mas que no agora, precisam que nós (talvez) sejamos mais do que tudo, uma vez mais, receptores das suas vontades, conversas, desabafos, traquinices...sem perda da sua autoridade, hierarquia, estatuto?

Como posso eu, querer ser a adulta que sou, gerir a minha vida, ter família e toda uma série de responsabilidades, e mesmo assim, entender que a minha mãe ou pai, se me perguntam se eu levo casaco, ou se volto cedo para casa, ou se sei basicamente tomar conta de mim, me estão a dizer que me amam, que ainda querem ter essa autoridade, ou sentir que ainda zelam por mim...como posso eu zelar por, então?


Nesta altura, vejo que todas as pequenas coisas que sempre caracterizaram a relação de pais e filhos ao longo de uma vida, de repente, se tornam incómodas, levam a discussões minúsculas, que nos afastam dos medos reais...onde estão vocês amanhã? E, que faço eu, sem vocês?



Levam a angústias de nos julgarmos constantemente, porque se disse ou se fez, algo que não se queria, ou porque não se fez como se queria. Questionamos-nos por tudo, numa culpa vazia, que nos prepara para o segundo, terceiro, quarto round...em repetição, porque não fazemos nada de novo...


Paremos com culpas, usemos o tempo de forma útil e não deixemos que se misturem as coisas, é o melhor que podemos fazer para lidar com tudo...eles são eles e, sempre foram. Nós somos nós e sempre o fomos, encontrar o equilíbrio é respeitar que nada mudou, só o tempo, e o peso que ele nos deposita nas costas...é apenas um desabafo, em própria pele e em pele de outros, normalmente acabamos por conseguir equilíbrios, é só continuar a olhar na direcção certa, baseados no amor que nos une...

Não partam, não queremos que partam, é só isso, não é?!

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Pelos caminhos aprende-se...por favor vai ao lixo e telefona-me...

Reflexões...pensamentos que nos surgem ou invadem, pela e na, partilha de momentos com os outros e as suas riquezas interiores, as suas histórias e caminhadas.

Hoje vi-me confrontada uma vez mais com a ideia de que num casal, às vezes não conseguimos ver com os olhos do outro, não nos conseguimos recolocar, ganhar distância...e o que a mim me parece óbvio, ao outro pode estar escondido numa catacumba.

Falavam-me de um relacionamento, em que o homem, sempre que podia e não estava acompanhado dos filhos, ou a trabalhar, tentava falar com a actual companheira, quando ia ao lixo, quando os putos dormiam, quando ia às compras, e de repente, a mulher, a nova namorada, partilha comigo como se sentia excluída, como sentia que apenas era contactada nesses momentos, como se existisse a vergonha (ao ir ao lixo!!!!!), ou a não permissão para que não existissem caminhos paralelos, e sim um único.

O meu foco e a aprendizagem partilhada aqui, não é tanto o tópico em si, porque num casal poderíam ser mil ao infinito, mas sim a tentativa de ilustrar a importância da nossa visão, ou olhar sobre...

Bastou-me proporcionar uma diferente visão, não interpretativa e ajudar a pensar por outros caminhos, abrir a possibilidade de que provavelmente o homem ligava, em entusiasmo, sempre que podia, ou que estava só, para ter um momento intimo e para talvez até não ser interrompido, e talvez pudessemos pensar que NUNCA lhe tenha passado pela cabeça que o fazia por VERGONHA ou EXCLUSÃO, sentires muito fortes vivenciados por quem não conseguiu imaginar esta versão.

Poderia estar uma manifestação de respeito por detrás desta acção (independentemente de ser a caminho do lixo), e não falta dele. Poderia haver carinho, mimo (namoro escondido, privado) e não VERGONHA...aquilo que a um poderia parecer pouco e ainda por acréscimo fazer pensar em sentimentos de exclusão e vergonha, ao outro poderiam ser manifestações de carinho, desejo de em todas as oportunidades mais sós estar presente, marcar presença num namoro mais intimo.

Mais, não só nos carregamos destas possíveis interpretações, como depois não falamos sobre elas, não as esmiuçamos, não as levamos à paz...ficamos presos nelas, preenchemos os vazios com imaginação, por vezes não só fértil, como cruel, e na presença do outro já levamos um muro de mágoa, de defesa, de tantas sensações antigas e presentes, e nesta falta de diálogo muros e fossos crescem...ou, são atirados à cabeça do outro, que "morre" executado às mãos do carrasco, sem defesa anterior.

O nosso olhar carrega-nos com toda a nossa bagagem e inseguranças e pinta, tolda, enfeita, interpreta, julga. Por isso mesmo, é tão importante, olhar em 360º, olhar de cima e de baixo, olhar de dentro e de fora e, depois de tanto olhar, ir pedir que nos mostrem os outros olhares, aqueles que não são meus, porque nem sempre, na maior parte das vezes, "o outro" não faz mal de propósito, tem razões, justificações e olhares que vêem mais, mais além, mais de mim.

Deixar para trás o medo de pedir, de querer saber, de me mostrar vulnerável ou insegura...esclarecer.

Construir no diálogo e, olhem...

- Vamos sempre ligar, mesmo que ao ir ao lixo...se essa for a prova de amor.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

E eu aqui sem respirar...

Desabafos...hoje são desabafos, das reflexões de quem se senta na minha frente e se queixa da Vida...do caminho.

Às vezes sentimos a vontade de deitar a toalha ao chão, de parar com optimismos excessivos e enfrentar que a dita cuja, muitas das vezes nos pespega com coisas muito pouco simpáticas e desgastantes, e que por vezes nos sentimos pequenas formigas obreiras em toda a sua força e fragilidade num mundo, do tamanho de um universo. 

Sem que ninguém se ofenda, eu acho que isto se manifesta porque por vezes nos sentimos tratados como os burros a quem oferecem a cenoura, mas, burros...não porque gostamos das cenouras, mas porque quem a tem, a vai afastando progressivamente de nós, mostrando-a, seduzindo-nos, mas, fazendo com que eu me vá dando cada vez mais e mais, e nunca a chegue nem sequer a cheirar. Verdade. Neste momento conheço muitos adultos que se sentem assim a nível profissional e às vezes a nível emocional.

Sabemos o que queremos, sonhamos com o que queremos, lutamos para ter ou ser o que queremos, mas, no dia-a-dia a "cenoura" afasta-se de nós e passa a ser um jogo de apanhada, em que na realidade corremos atrás da nossa própria cauda, tornando a corrida numa impossibilidade.

Porque nos fazem isto? Porque nos fazemos isto? Porque ambicionamos reconhecimento, recompensa, concretização, porque se formos feitos de boa massa, queremos continuar fieis à nossa pessoa, e não queremos desistir, mas sem dúvida algo tem de mudar neste paradigma, para que possamos pelo caminho, talvez não parar de correr pela cenoura, não nos deixarmos morrer na praia, mas não nos destruirmos à beira de conseguirmos as cenouras.

Difícil o desafio, porque às vezes quando nos apercebemos que já andamos nisto há muito tempo, e que não há meio de alcançar a cenoura, já estamos esgotados, às vezes desiludidos connosco, com o sistema, com o mundo...e quando por ai se está é difícil manter o tal optimismo, que se diz ser necessário para continuar a caminhada, como se de água se tratasse num passeio pelo deserto.

Às vezes, nestes momentos. talvez funcione melhor não ser um optimista, que beire o irrealista, não sermos uns caçadores de felicidade, mas sim deixarmos assentar a poeĩra desta realidade de nadar em constante movimento, contra uma ou várias marés, que não dependem de nós. Às vezes é bom saber que isto é difícil e que realmente temos sido uns lutadores, uns guerreiros, uns persistentes e que face a tudo o que vivemos, muitos teriam desistido. Podemos por segundos, dar umas palmadinhas nos nossos ombros e perceber que temos sido por vezes uns fantoches nas mãos de uma vida de bulício, numa rodinha de hamster, que temos feito rodar sem parar para ir atrás dos sonhos, das vontades, de ambições pessoais, tentando sempre manter a vontade, a perseverança, o optimismo de ver o copo meio cheio, mas facto é, que durante esses segundo podemos perceber que por vezes ele esteve meio vazio, não chegou de um todo.

Este reconhecimento de que não podemos ser sempre optimistas porque o desgaste também é muito grande, pode trazer um balão de oxigénio no reconhecimento de tudo o que temos passado. Dar a paz que precisamos para continuar o caminho, deixando que a cenoura às vezes vá para mais longe, sem que a minha resposta tenha de ser sempre o máximo, ou mais do que o que posso dar...sentir a minha humanidade em mim. Perceber os meus limites e limitações, redefinir o caminho, e talvez saborear algumas azedas pelo caminho, amoras, e perceber que a cenoura poderá estar sempre a fugir de mim, se eu não equacionar mudanças de estratégia, pausas, caminhos alternativos, ou até desvios...

Não respirar, faz mal, muito mal mesmo...não respirar fundo arrasa-nos, não olhar o infinito, desfocando o presente (a cenoura), também nos arrasa. Não parar, não dormir, levar o peso do mundo e da responsabilidade nos ombros, somado ao desejo de alcançar mais e mais, e de sorriso no rosto, também faz mal.

Sejamos honestos, humildes e saibamos a todo o momento, onde estamos e para onde vamos. Mesmo que andemos perdidos.

Deixemos que a mudança se instale, e nos desconfortos de por vezes não conseguirmos sorrir perante a adversidade, não façamos uma fuga à dor, num optimismo disfarçado, mas sim, façamos um convívio intimo com esse desconforto, e num relacionamento intenso, de parceria, então, consigamos olhar o horizonte, e em vez de ver os barcos e o mar, consigamos contar as nuvens e perceber que se consegue tocar o céu, com os pés na terra.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

Filhos do e no coração...

Há momentos da vida, do desenvolvimento, do caminho que são tão difíceis, quase desesperantes...
Ver um filho crescer e querer ser ele próprio é a viagem mais bela para um pai, é ver uma obra que tem o nosso cunho, seguir caminho, vingar na vida, como uma árvore que cresce ao vento, moldando-se através das experiências que tem...

É ver um ser, uma pessoa, fazer-se, por si mesmo, ás vezes revelando o que tentámos ensinar, o que passamos pelos nossos próprios comportamentos, vendo neles trejeitos tão próprios e às vezes tão reflexos de um espelho nosso.

É aprender a ver de longe, a deixar ir, a acudir de perto, a querer impedir o sofrer, deles, e o nosso tantas vezes. É sorrir pelos sorrisos, é chorar pelas suas mágoas, é querer ser mais do que nós próprios para os trazermos pela vida ao colo, ao nosso colo, no nosso afago.

É querer saber o amanhã, para os ensinar hoje o que precisam, é ser posto à distância, ouvir o que não se quer, é dar espaço à revolta, dizer disparates na zanga, e logo de seguida sentir que tudo é nada, e nada é tudo.

Eles não nos chegam, fazem-nos falta e fazem-nos questionar todos os métodos de orientação que temos.

Fazem-nos saber que o norte não está sempre lá, fazem-nos saber que temos limites finitos e infinitos, que temos forças que desconhecemos , fazem-nos saber o que é resiliência e resistência.

No fim de cada troço, aventura, pedaço de caminho, respiramos fundo, e mesmo que o susto tenha sido grande, a certeza de um amor infinito está lá, mais do que escrita em pedra, escrita na pele, nas células que nos compõem, no sangue que nos corre na vida, tão certo, que independentemente do que façam, há espaço para perdoar, esquecer, tolerar, amar...amar muito.

Mas, bolas, é difícil saber, às vezes, tantas vezes, por onde ir, o que dizer, medir a liberdade, medir o castigo, ensinar e escolher as lições, dar e tirar, exigir ou receber...às vezes não se sabe, somos tão crianças imberbes quanto eles e, perdidos no estado adulto, onde devemos, temos de, saber o que fazer...lá de cima da experiência, sentimos-nos vulneráveis, sós na batalha, desorientados, porque andamos que nem loucos a correr na frente das suas passadas a aprender caminho, para podermos fazer com eles o deles.

Cada vez mais repito, nascemos pais quando nos nascem os filhos, experiência nula até então, teoria, talvez, até muita...modelos, alguns sem dúvida, mas andar nestas aventuras é como aprender seja o que for muiiiiiittttooooooooo complicado, só na prática é que se aprende. E a cada erro, aprende-se mais, e a cada técnica falhada, mais um pouco e mais um pouco.

Se chega? A mim não. Sou mãe de quatro, e renovo os erros a cada um...aprendo e reaprendo, mas não sinto a viagem tornar-se mais fácil.
Perguntam-me se é belo? Se repetia? Se tinha de novo?
Sim, sim e sim...

Mas, cada fase tem os seus desafios, e a adolescência é realmente, montanha russa. Como podemos num mundo em constante mudança, ajudar um ser que amamos desmesuradamente, a encontrar-se, ser feliz, amar-se e amar-nos, com um Norte certo, o seu, de modo a que não sinta que no processo de educar e não ser "amigo" (pois esse não vejo como sendo o meu/nosso papel) eu, enquanto mãe, ou pai, não os queremos asfixiar no nosso modelo, à nossa imagem, com os nossos valores.

Só queremos que num espaço, definido como família, casa, ninho...o amor vença, o carinho e a ternura superem tudo. Que saibam que os aceitaremos em pleno, como são, ainda que seja apenas um caminho de rebeldia para que se distanciem de nós, num movimento, talvez inato, de separação, de encontro com eles mesmos...mas, ao querermos que eles saibam isto, mas em simultâneo não querendo que sintam que não estamos lá, para educar, para moldar, passar testemunho, encontramos a resistência cega do querer crescer, do querer ser diferente de nós, do querer igualdade, os mesmos direitos que o adulto...e, talvez, não seja fácil, ser-se criança adulta ou um adulto criança...não há conforto em nenhum dos mundos, porque já não pertencem a um, mas também não pertencem ao outro, nos seus direitos plenos.

Têm de sentir que acatam as nossas regras, a nossa forma de estar, as nossas injustiças ao educar, os nossos erros, numa exigência da nossa parte, de muitas vezes se calarem ou não argumentarem contra nós.

Se lhes damos razão, perderemos autoridade? Não, mas podemos não conseguir chegar a. Se lhes pedimos desculpa, erramos? Não, mostramos-nos humildes na aprendizagem que temos de fazer com eles, e mostramos que somos capazes de ver onde erramos, mas, isso não nos aproxima deles...pode às vezes até fomentar mais rebeldia, zanga, revolta...

Como é possível um processo tão belo, ser tão complexo e difícil...tão culpabilizante, emotivo, desesperante às vezes.

Um processo que se recheia de amor, com o objectivo de dar amor, com o caminho traçado nas linhas do amor, e por vezes tão carregado de um extremo negativo de desapego e revolta.

Ser crescido não é fácil, e crescer também não.

Talvez funcione melhor, se conseguirmos juntar esforços e nos tornemos alunos do aluno, e eles, professores do professor.

Talvez seja ainda melhor, ou mais reconfortante, saber que todos os dias temos hipóteses de continuar, melhorar, reformular, pedir, dar, ensinar, mostrar...que todos os dias lhes podemos renovar os nossos votos de amor, de entrega e de vontade superior de os tornar em pessoas capazes de serem felizes.

Bem hajam os meus filhos, que me fazem estar em constante processo de reflexão, de querer ser melhor e me superar nos meus limites e defeitos. De poder ensinar o que não sei, aprender o que não tive, histórias todos os dias por escrever, em páginas brancas que se multiplicam.

Caminhemos, seguros que por amor, o caminho se faz.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Final feliz...

Uiiii
Que coisa é essa? Fenómeno educativo, realidade possível, sonho encantado, história antiga???
É possível haver um final feliz?
Depende...porque se houver um final, como pode ser feliz, se ser feliz é continuidade, é crescimento, é caminho a desbravar, é algo a usufruir, a não terminar, certo?

Podemos ter capítulos felizes, troços felizes, mas, se colocamos a palavra que lhes dá término, teremos então finais felizes?
Feliz é a conquista, o momento, o ar que nos beija o rosto, ao levantar da cama, é sabermos-nos vivos, por dentro, em chama dorida ou contente.
Feliz é amor, é ser, é estar, é ter com quem dividir, com quem achar que não se quer ter um final, mas sim um para sempre, um eterno, um amanhã depois de tantos outros.

Ser feliz é saber que se é.
É não duvidar que se pode, ser feliz é viver a respirar fundo, sem ranger o dente ou franzir o sobrolho.
Ser feliz é rir sem razão, é ter harmonia e melodia com as canções do caminho.
É viver-se desconfortável com quem somos, porque sabemos que podemos ser melhores.

Ser feliz é tão básico como comer uma bola de Berlim, fazer barulho a chupar uma palhinha, quase cair mas escapar no último momento, é encontrar o último número dos sapatos que amamos, comprar uma pechincha, receber um beijo mal dado talvez quasi roubado...
Ser feliz é sermos em nós o desconhecido, numa aventura em 80 dias, é conseguir achar que 31536000 segundos é pouco tempo para tudo o que quero...

Ser feliz é sentir cheiros, tocar a pele, sentir calor, agasalhar o frio, arrepiar a pele, sonhar acordado, beijar o ar, saber truques de magia, acreditar nas fadas e nos unicórnios, termos coragem de tatuar a pele ou o coração...
Ser feliz é ouvir, a música, o choro alheio, o riso de uma criança, o chilrear dos pássaros...

Levar com chuva na cara e sorrir, ver o pôr e o nascer do sol, sentir a plenitude do que temos em nós...é ser capaz de viver extremos, suportar dores, aguentar caminhos e desafios, é sermos donos de obras de arte nas nossas mãos, e uma orquestra a trabalhar para nós.

Ser feliz, é viver sem finais, é viver em continuum, em perpétuo movimento, crescendo até onde a nossa alma for.
Ser feliz é ser eu e amar o eu que sou.

É ser eu e sentir-me em construção, mas ter garra de leão.

Ser feliz é ser eu nos outros, sentir-me vivo no outro, sentir que a minha história fica cá, em partículas, em pedacinhos de mim, que fazem com que ser feliz não acabe aqui e agora, só porque sim.

Um final feliz, é saber que nada acaba e tudo é...
Vamos ser felizes???
Bora lá...

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Vida de ofertas...caminhos de escolhas...

Sejamos adultos, jovens ou crianças, no virar da esquina temos constantes ofertas, do mundo que nos rodeia, dos que connosco se relacionam, dos que nos amam...ou que nos são indiferentes, dos media...do clima, da Vida...essas ofertas implicam escolhas, que resultam em caminhos e consequências, que nos levam então a mais caminhos e escolhas, e mais ofertas...

E que fazemos nós?

Às vezes...afogamos-nos...perdemos o norte...ficamos sem caminho, ou perdemos-nos nas escolhas...

Chegam-me jovens bombardeados por ofertas tentadoras, sem capacidade de decisão, pressionados a decidir pelos pares, de forma a manterem um certo estatuto...

Chegam-me crianças que não brincam, porque a oferta é tanta, que não sabem escolher, ou, o brincar perdeu a graça...

Chegam adultos...em caminhos entrelaçados, trocados, desorientados, perdidos nos meandros de tanta direcção, de tanto caminho...de tanta oferta e, incapazes de decisão.

Que Vida é esta de hoje, em que nos perdemos nas escolhas entre pedaços, aroma, light, liquídos, bífidus, zero, grego, tipo grego, marca ou linha branca, embalagem pequena ou grande, entre tantas outras que talvez me esteja a esquecer...só falando de iogurtes...

Escolha de complementos a um detergente de roupa que supostamente compramos para lavar a dita, mas que se não colocarmos aditivos, não saem as nódoas, se não pusermos umas toalhitas, as cores misturam-se, se não colocarmos amaciador afinal a roupa fica áspera, se não tiver pastilhas para o calcário a máquina avaria e a roupa não limpa...uma vida em que se compra algo supostamente incompleto, até na sua função principal, e que nós, de forma encarneirada, aceitamos e vamos comprando tudo o resto que tem de ser vendido para que a indústria do que é necessário se reinvente.

Que nos percamos em decisões de escolha de actividades desportivas extra para os nossos filhos, o inglês, a informática, as actividades extra-curriculares, o apoio ao estudo, ou dez mil outras questões educativas, de suposta resolução ao verdadeiro problema do tempo, ou ausência deste, e de responder ao desaparecimento da corrida nos intervalos, do futebol na praceta do bairro, do lanche na vizinha, ou de tantas outras respostas saudáveis e comunitárias, que surgiam atempadamente porque o tempo não se decidia, vivia-se.

Será que é uma escolha do que para nada serve?
Uma escolha de Orientações?
Ocupações de tempo vazias?

Saborear e apreciar o que a nada sabe...

Um fenómeno do Rei vai nu...em que a vida e os que nos rodeiam, a sociedade talvez...nos empurre para constantes bifurcações de caminho que cada vez se tornam mais frequentes, mais presentes, nem sempre mais urgentes ou de valor...que nos desgastam no dia-a-dia, nos levam a drenar energias, e depois enfrentar o não saber...o estar sem rumo. Todos vemos, mas temos vergonha de dizer o que realmente vemos?

Vejo os vossos olhares aqui à minha frente, perdidos, sem saber...na procura, no pedido "que vou eu fazer?".

Do mais simples ao mais complicado...o olhar vagueia, porque às vezes já não se quer decidir, tomar um rumo. Porque se pode estar errado, com receio do impacto da decisão e questionando de fundo: e se eu não educo bem? E, se eu não sei o que dizer na altura certa e se revolto o meu filho, se não o faço sentir o meu amor, e se não arranjo emprego, e se não recebo o dinheiro, e se, e se...?

Que desejo de certezas é este que nos invade e nos inibe, ou, nos impede de não decidir, ou de deixar ir...ou de decidir, tomar controlo, decidir e assumir...Porque se esquece que a melhor decisão foi a que se soube tomar, a que se tomou, porque o que se sabe hoje não se sabia na altura. A cada momento decidimos com o que temos em mão, só depois podemos ir afinando o caminho, ajustando as coordenadas, mas sem culpas vazias, sem deveres escondidos...onde se perdeu o conforto de nos aceitarmos e saber que se fez o melhor, a maior parte das vezes.

A visão do certo, do amanhã, do infalível, não nos pertence, por isso fazemos malabarismo intelectual com as variáveis que temos e decidimos de coração, por isso decidimos bem...Amanhã, logo se vê, amanhã é o dia em que posso mudar, acertar, renovar, identificar e seguir em frente...continuar fiel às decisões que se tomaram.

Não valorizemos o que não tem valor, não percamos tempos, ou energias, em coisas que nos consomem de foro vazio, de esgotamento incessante em questões filosóficas que no proveito individual não acrescentam.

Não digo que não pensem, que não reflictam, que não ponderem, tudo isso é crucial para a decisão mais certa, mais confortável, com o que eu sinto e como estou, mas, digo sim, assumam, sigam e conforme a trama se desenrola, sigam adaptando e mudando o que há a mudar. Mas, não se importem com detalhes microscópicos, foquem-se no que é deveras importante, na visão panorâmica - a visão global, a que nos deixa amar a vida, a nossa vida, o nosso eu, e levar o caminho para a frente, de cabeça erguida, de foco no horizonte, de brisa no rosto, capazes de vencer tudo e todos, fazer resultar e acreditar em nós é o mais importante...decidir para seguir, para poder ajustar, para poder melhorar, para poder encontrar paz.

Às vezes, as escolhas não são tantas assim e nós sabemos o que fazer, há que confiar. 

domingo, 23 de novembro de 2014

Pensar positivo no cancro...


“Sentes-te em baixo? 

Sobe a uma cadeira e deixa-te ficar alto, até passar a neura…no cancro aconselho sorrir”


É um desafio? Sim…mas que é da Vida sem um belo desafio, num dia em que nos vestem de preto pela notícia partilhada, enviada…matamos o mensageiro, ou, recolhemos ao interior de nós, e fazemos aquilo que a Vida nos ensina ao longo das múltiplas etapas pelas quais passamos e caímos e, nos permitem, aprender a levantar.

Viver com cancro, saber que se tem cancro, lidar com quem nos rodeia e que sabe o que sabemos…lidar com as nossas lágrimas e as dos outros, agarrar os aspectos lógicos e práticos, ou implorarforças metafísicas…ter de ter forças para mim e para o outro, ou mandar dar tudo uma volta, e recolher,a um cantinho, recusando-me a crescer, a aceitar…
Mergulhos de um infinito pesar, cheios de fragilidades, que noslevam ao medo…que escurecem a estrada, quem me diz…como sair daqui…todos me dizem ou sugerem “tem força”, “vais vencer isto”…”vais ver que não é nada, que vais ser um doscasos de sucesso”, mas olho no olho, cara na cara, sinto, leio… as mentiras em que, nem eles, nem eu, acreditamos.

Passo fases, claro que passo, e nem todos nós enfrentamos situações destas da mesma maneira, com as mesmas forças, vontades, redes de suporte, ou garra, de lutar pela Vida, seja ela apenas a que me resta (copo meio vazio), ou aquela que eu quero que seja, em pleno e até onde eu for (copo meio cheio).

Estas lutas internas existem porque temos que pensar, por nós, pelas condições com as quais me confronto, mas o meu pensar não é virgem, ileso, carrega-se de circunstâncias vividas, da minha personalidade e de todo o passado e bagagem que carrego até…ao maldito momento de confronto com o pássaro preto…portador de notícias…mas o que dita o meu pensar dai para a frente também vai depender daquilo que é o meu comportamento típico, o estado de animo que me costuma caracterizar e as reacções físicas que estes socos no estomago vão evocar em mim, no meu corpo, na minha alma, e na minha mente…

Aquilo que sei, por trabalhar há mais de vinte anos com pessoas, é que frequentemente demasiadas pessoas, demasiadas vezes, se desvalorizam, não reconhecendo a grandeza do ser humano, e acabam por valorizar em excesso, ou pior ainda, desmesuradamente aquilo que não são…logo este pensar pode trazer um desequilíbrio entre, o que eu realmente sou capaz de fazer, por mim, pela doença, pela luta em que me enfiaram sem ter sido convidado, ou sem ter sido parceiro activo; e aquilo que me sinto realmente capaz de fazer, de sentir. Chegando a questionar as forças que me levam dali para a frente, ganhando uma amnésia de sentir, que me impede de reconhecer em mim o anterior guerreiro, lutador, que se agarrava a qualquer coisa, para alimentar a caminhada em frente.

Então qual é o meu papel neste capítulo…? Mostrar que é possível pensar positivo no cancro, e ajudar a mostrar através de algumas partilhas e reflexões, que depois da pancada inicial, depois de ter ido ao chão, e batido com a cara, a pessoa ajudada pode lutar contra o previsível, mudar as marés, alterar os caminhos e os destinos, enganar o tempo, por em causa as decisões da natureza ou do Criador...e tomar por suas mãos, um processo, que ainda que não seja totalmente vitorioso, afasta a pessoa da sombra, do certo e faz nascer esperança no desconhecido, no 1%, nos anjos da guarda, nas estrelas, na força que se encontra dentro de si.
Porquê? Porque o fim é certo para mim, para ti, para si…e é tão só chegar lá só…e mais cedo.

Porquê? Porque se eu puder fazer crescer a minha vida um minuto, e que esse minuto seja de prazer, enganei o destino, e curti, maisum pouco…
Porquê? Porque sim, porque quero, porque vou decidir que esse é o caminho e esse é o que me assegura respeitar a minha pessoa até ao fim, permitindo que tudo aquilo a que tenho direito não me seja violentamente roubado, e porque se assim fizer, vou ter forças para enfrentar as tretas que resultam dos tratamentos, as dificuldades que me vão fazer querer desistir meia dúzia de vezes…senão uma dúzia mesmo.

Porque, na realidade eu não sabia quão forte eu era, até perceber que ser forte é a única escolha que tenho…porque só assim vivo, não estagno, não me resigno, a uma doença, que se impôs sem convite dentro do meu corpo…e sei, que com esta atitude, vou fazê-la sentir-se estranha, incomoda, a mais…e talvez se conseguir fazer esta dança, de expulsão, eu ganhe de novo o controlo sobre a minha casa, este habitáculo onde aprendi a viver os anos todos que me ficam para trás, e no qual não permito, gente que me queria mal.

É pensar…eu posso conseguir tudo (…querendo lá eu saber o que é “ tudo”agora, no meio de viver com cancro), se o quiser com toda a força, no meio de pensamentos mágicos, desejando-o mais do que tudo, com uma força que me rasga a pele, e se une às energias dos que me amam, e zelam por mim, que me sai pelos poros, e se junta e flui de mim para a energia do mundo inteiro, ao qual pertenço…do qual faço parte.

E ao pensar tudo isto, cresço, ganho tamanho de gigante, alcanço o céu com as pontas dos dedos, e acredito que vou vencer, agarro-me a essa escada vinda do céu, lançada por mim, e subo por ela, ganho altura, ganho sonhos… que me recordo terem ajudado na minha infância…lembro-me bem de tapar a cabeça, já na cama, no escuro, depois de ter visto um monstro no quarto, e para surpresa minha sempre que voltava a destapar a cabeça, o monstro tinha desaparecido, e assim percebi que tinha poderes mágicos…que uso até hoje, que quero usar agora e acreditar.

Quero acreditar que independentemente da minha idade, da minha doença, eu sou jovem! Eu tenho forças dentro de mim que me permitem acreditar que o positivo também existe, e que vem equilibrar o negativo. Numa luta entre super-heróis, em que um é o bom, reservando esse papel para mim, e o outro é o mau da fita, deixando esse papel para o cancro. Acreditar que a Vida me tem mostrado que com o negativo vem sempre o positivo, ou vice-versa, como se inseparáveis fossem. E se assim é, porque me deixaria eu, desligar do positivo, ignorar os seus acenos, focando-me naquele que me suga e me destrói…nem pensar, eu tento é desequilibrar a balança…e aumentar o positivo. Um dia a vitória vai ser nossa. Sim, eu consigo!

Acreditar que conheço velhos de 18 anos, mas que eu não vou permitir que um conceito criado pelos humanos –o tempo – me prenda, me restrinja, me deprima, e me mande abaixo. Não, eu agarro nos meus próprios ombros, abano-me, abraço-me, inspiro forte e sinto a Vida a fazer-se entrar pela minha boca e nariz…carregada de estrelas, magia, suspiros de Vida e amor, que me encherá de uma luz, minha, só minha, que me ilumina os passos, a Luta, o caminho.

Poderia falar de estudos controversos, cientificamente incorrectos, milagres mal explicados, a ciência no seu auge, em que todos ou alguns, discutem casos de cancro que se curam sem explicação, pelo menos plausível …poderia falar de teorias que existem em que, nos colocam a pensar nas células más que em mim habitam, e aprendendo posso visualizar a sua expulsão do meu corpo, e numa forma específica de meditação tentar que uma a uma, saíssem por onde entraram, sem qualquer cerimónia…mas neste capítulo, não me cabe provar a existência de estudos ou curas, mas sim despertar a vontade de perceberque o positivismo, o humor, a ajuda à luta que tem de ser travada, e a ajuda que permite desacelerar, parar e, prolongar a Vida dos processos que fazem parte, ou podem ser parte, do combate ao cancro.

Cabe-me criar uma esperança, uma fé, uma visão dourada e optimista das diferenças que crenças, atitudes e pensamentos podem desempenhar no desenrolar de uma história, da qual, me parece que, aparentemente todos têm medo de já saber o fim.

Todos temos a experiência, sem novidade, que quando pensamos positivo, conseguimos estar melhor, sentirmo-nos mais felizes, muito mais capazes de enfrentar tudo o que a Vida decida presentear-nos…os desafios que se nos colocam no dia-a-dia. Pensar bem, pensar de forma a identificar o que existe de positivo, e conseguir agarrar-me a esses pensares de forma a conseguir acreditar que mesmo no meio de tudo, há sempre algo que se pode fazer, um sentimento que ainda não se teve ou viveu, um amor por nós e pela nossa Vida…conseguimos então “curar”as enfermidades que nos assolam, quer a alma, quer o corpo.


Quanto mais feliz ando, mais apaixonado me sinto, pela Vida, pelo próprio viver, por quem sou, por quem me ama…melhor me sinto, menos stress, menos dores de costas, ou de cabeça…se conseguir recriar estes sentires, estas vontades, e canaliza-las para esta batalha, uma atrás da outra, posso pensar que talvez vença a guerra, e que talvez mesmo que não a vença, a cada batalha vencida, ganhei no contra-relógio, lutei contra o previsível, enganei e defraudei, o senhor do fato preto.

E decidi que hoje é um bom dia, para ter um bom dia!

Hoje é um bom dia, para me virar para o meu interior e agarrar-me pelas pontas e tomar uma decisão que me pode ajudar a mudar radicalmente o percurso que se vai seguir, com a decisão que esse caminho estará sob parte do meu controlo, ainda que tenha de partilhar o lugar de condutor de vez em quando.

Na relação, com os outros, ou connosco mesmos, temos todos os nossos momentos. Momentos de prazer em que nos olhamos nos olhos, e sentimos que o outro nos conquista, no dia-a-dia, nos seus gestos de prazer que até já podem ser gestos conhecidos de cor...Momentos em que sabemos de certeza absoluta que gostamos de nós, até mesmo muito, e que gostamos da nossa vida, mas se num improviso nos atrevemos a questionar, porquê? Vamos levar o nosso tempo a filtrar toda uma série de informações, mal- arrumadas e confusas, que tendemos a organizar de forma que nem nós percebemos porquê, mas que no fundo nos asseguram a certeza de sentimentos que muitas vezes nem questionamos.

Na vivência da rotina, do quotidiano, das pequenas coisas da Vida, esses cantos já não muito organizados, ou até arrumados, podem ficar esquecidos ou pelo menos arrefecidos, mas no meio de um processo de procura, de encontro, de luta, por mim, pela minha Vida, pelos outros que me rodeiam, vão ganhando forma se deixarmos, e vão dando força para lutar em acreditar que todas as situações podem vir a ficar melhores.

Aqui, começou-se um caminho de reconstrução pelo qual vale a pena caminhar, pois todas as conquistas, ainda que pequenas são nossas, são suas...e daí, ainda que com alguns recuos, a caminhada pode continuar e com mais sentido, sem nada adormecido ou arrefecido. Claro que dá trabalho, e em momentos como estes, enfrentar a doença, os outros, e ganhar esta vontade de trabalhar para seguir em frente, pode tornar-se difícil. Mas, peço-vos que pensem em exemplos, exemplos de algo que vocês sintam que vos preenche, encante, vos dê sentido à Vida e a quem somos ligados, ou queremos ser. E digam-me, que não vos dá trabalho! Não acredito, que o consiga fazer. Tudo na nossa Vida, bom, melhor, mau, dá trabalho, por isso vale a pena trabalhar, lutar para transformar o mau em bom, ou não deixar o bom ficar mau.

A cada passo para trás, ou pausa, ou caminhada para o lado, pense na conquista, no fim, e pense em tudo o que já ganhou só porque tentou e não desistiu. Pense que ao dar tudo por tudo, não desiste, e transforma o que não era bom, em possibilidades. Melhora-se a si no processo.

E se às vezes me apetece desistir, não deixo, faço com que acorde, e tento pensar que não passou de um sonho mau, reencontro o desafio de atingir
o que quero, lutar contra o que me invade,e na minha luta mostrar que consigo viver a minha Vida, que faço questão de o fazer, de seguir em frente, e conseguir viver prazer, um prazer máximo de viver tudo como se fosse a primeira e a última vez, de tirar prazer de pequenas coisas, e neste momento de procura intensa de felicidade, encontra-la nestas coisas, nestes momentos, e com isso ter sentimentos positivos, energias que me levantam e permitem viver a Vida em pleno, independentemente das cargas que carrego nas costas.

Faço-o só, faço-o junto daquele(s) que, mesmo que às vezes eu não saiba porquê, eu tenho a certeza de que quero e amo…que caminham comigo nesta estrada como se fosse a única que eu alguma vez conheci. Eu decidi-me,
o caminho faz-se caminhando, para a frente, em direcção ao destino que eu decidi…viver, em pleno, ser feliz! Paixão, esperança...sentimentos de uma força imensa, de uma natureza especial, e que para mim significam VIDA.


Temos a responsabilidade de incendiar os nossos corações e ensiná-los a amar esta nova forma de Vida e a viver em paixão, e intensamente os seus momentos.

O meu tempo é agora, e não posso perder tempo a falar de um tempo que já foi, e um tempo que tive em tempos…E se não reflectirmos um pouco sobre a nossa Vida, a paixão e entusiasmo que temos de ter, baseados numa esperança vinda de dentro, leva-nos a um sentimento generalizado de impotência e tristeza, e connosco, arrastamos os que nos rodeiam, dando espaço à doença.

A palavra de ordem para o combate é Paixão por nós, por quem somos, por aquilo que representamos, em nós e dentro de nós, por aquilo que valemos e defendemos, é paixão por saber que podemos sempre ser melhores, podemos sempre surpreender o outro e nós próprios, acreditando que esta força que nos dá energia e brota dentro de nós, nos apaixona com força suficiente para acreditar que tudo isto, este turbilhão de cores e forças, se revolta no nosso interior, e encontra expressão no gesto que fazemos ao cuidar de nós.

É o reconhecer com optimismo quem somos neste momento das nossas vidas, com tudo o que é de bom e de mau, mas sem os quais eu não seria eu, e por isso, os outros também não poderiam ser os outros. É amar em mim o que existe,e numa entrega quase louca encontrar um propósito, que me dá um caminho e me indica o que quero ser, onde quero chegar, e tudo aquilo que represento e em que acredito, recusando-me a ser menos do que isso, só porque tenho cancro…

É gostar de mim, aceitar-me, não querendo com isso estagnar, e reviver os ditos momentos de juventude já idos, em que fui isto ou aquilo, mais feliz do que agora (penso eu), e que me arrasta constantemente para um passado, não me permitindo viver o presente e assumir que, independentemente do desafio imposto pela doença, a idade que tenho agora me permite aceitar em mim, coisas que levei uma vida a combater, que me permite batalhar agora por aquelas que faz sentido mudar, mudar por mim, mudar por amor, mudar porque sim, não mudar é que não.

É encontrar um caminho, mesmo onde eu não o tinha desenhado, pois tenho e descobri de dentro, uma paixão de viver, esta vida, pois é a que tenho, e que não me vai deixar desistir. Deixemo-nos então, de não sentir, de fugir, de nos rodearmos de afazeres como formigas obreiras, que não param, e que se focam em construir algo, grande, e que não nos permite viver o positivo, a dádiva que a vida é…em si e nos relacionamentos que asseguramos.

Não deixemos que a paixão morra, não se deixem afogar em lágrimas de desânimo, momentos de incerteza, e uma mudez que não nos permite dar voz, a tudo o que brota de dentro de nós e nos diz para fazermos diferente, para sermos diferentes. Não deixemos a chama apagar-se, e dar lugar a um sentimento que nos prega, não a uma cruz de vida, mas uma desistência amarga, e com mais uma ou menos uma lágrima, vamos culpando outras entidades, por esta morte lenta do sentirvivo.

Deixamos voar a nossa vida das nossas mãos, sem controlo, entregando e confiando, não sei muito bem em quê ou quem, e se por momentos temos rasgos de lucidez, acordamos e agarramos quem amamos para um beijo,um afago, a agarrarem a Vida, e a não a deixarem ir.

Nós todos temos de acreditar, acreditar em nós, na mudança, nos outros e na energia que move este acreditar e esta mudança, fazendo nascer o potencial, do sonho, do desejo, do querer, daquilo que uma vez mais nos caracteriza. A criatividade de dar a volta por cima, o desejo de resiliência, que nos impulsiona a levantar mesmo depois de cair...desejo esse que para ocorrer, eu tenho de me sentir vivo, dono de mim, e com forças para acreditar que ainda sou capaz.

Desejos para que do nada surja algo, um novo eu, que se encontra com outros, e neles também renasce. Um eu, que quer ser diferente e arrastaratrás de si, uma multidão, uma comunidade, que quer acreditar que pode vencer por ter as ferramentas que os deixem sonhar, por sonhar junto deles baixinho, na terra da fantasia, onde todos somos iguais.

Olhar à nossa volta e sentir que há algo belo, e que viver essa beleza, intensamente, no dia-a-dia, com os que me rodeiam, me responsabiliza, me obriga a respirar essa energia, positiva, que me permite analisar e dizer neste momento posso estar feliz. E que amanhã posso repetir, e acreditar que se eu não me deixar acomodar, não resolvo todas as dificuldades e não acabo com os problemas no mundo, mas minimizo, e muito, os meus e a forma como os carrego.

Abrir os braços e respirar fundo, dando a mim mesmo momentos em que me encontro comigo sem reservas e jogos de escondidas e me prometo, a mim mesmo, me entrego a amores meus, para depois me entregar aos teus amores, com toda a força e energia, e nesse exemplo, sem palavras, dar esperança de vida a mim, não me deixando desistir, ou acomodar. Num respeito pela linha da minha Vida que carrego entre as minhas mãos nos meus actos de todos os dias, e no respeito a essa oferta, faço melhor uso dela. Claro que não estou a ignorar a doença, e todos os seus problemas, pois essa é a natureza da "besta", a Vida assim é, e está constantemente a por à prova todos os nossos conceitos e forças. No entanto, se todos os dias, eu me esforçar por não me esquecer, por me dedicar, por me querer manter vivo, e acima de tudo, aprender o que é que na realidade isso significa para mim, então, quase que de forma religiosa, como alguns cultivam o corpo, a mente, a fé, eu cultivarei esta minha vontade de estar vivo, apaixonado, e cheio de esperança.

E com todas as forças que tenha naquele dia, naquele momento, agarrar-me-ei ao que for preciso para acreditar que o amanhã pode sempre ser melhor, que eu posso sempre ser melhor, e que se eu me entregar, se eu der, se eu viver intensamente cada momento, bom e mau, não deixo que a esperança morra, não me deixo morrer de desgosto, nem da doença.


Eu consigo, eu viverei!
Para sempre...








Obrigada Vanessa e Rodrigo...que as minhas palavras façam sentido, abraço do coração...